NOTA PÚBLICA
Diante dos questionamentos encaminhados por veículos de imprensa, bem como ante a propagação de comentários imprecisos sobre o caso e sua repercussão local, faz-se necessários alguns esclarecimentos à comunidade e aos familiares da vítima:
1. Daniela M. F. foi presa em flagrante, no dia 08/11/2024, acusada de ter matado a vítima com um golpe de faca, que, segundo informações constantes no processo, seria seu namorado;
2. A suspeita, mesmo sendo primária e de bons antecedentes (ou seja, não tinha nenhuma passagem criminal), teve sua prisão preventiva decretada e respondeu a todo o processo presa “em regime fechado”, sem direito à “saidinha”;
3. Diante das informações iniciais, o Ministério Público, por seu Promotor de Justiça criminal, ofereceu denúncia contra a suspeita;
4. É importante esclarecer que, de acordo com as leis brasileiras, somente ao final do processo, com a colheita de todas as provas indicadas pela acusação e pela defesa, é que se torna possível ao Juiz decidir se a pessoa acusada cometeu ou não o crime e, por consequência, condená-la, encaminhá-la para o Júri ou absolvê-la. A denúncia, portanto, é o que dá início ao processo e se trata de uma mera possibilidade, uma hipótese, que precisa ser confirmada por meio de provas;
5. A denúncia foi então recebida e o processo teve início. Durante o andamento do processo foram realizadas apreensões, inclusive da arma do crime, perícias (na arma e na vítima) e demais exames, bem como ouvidas as testemunhas, inclusive os policiais responsáveis pela prisão em flagrante da acusada e realizado seu interrogatório;
6. Ao final do processo, o Promotor de Justiça requereu a absolvição da acusada, uma vez que se convenceu de que ela agiu em legítima defesa. Do mesmo modo, o Advogado da acusada se manifestou pela sua absolvição. Ou seja, tanto acusação pública quanto a defesa, estudando o processo e analisando as evidências, pediram pela absolvição e soltura da ré;
7. Diante disso, o Juiz, analisando o processo, acolheu os pedidos do Ministério Público e da Defesa, também se convencendo, pelas provas que integravam o processo, de que a acusada teria agido em legítima defesa;
8. Embora toda morte seja triste e deva ser evitada e reprimida, a Lei brasileira (concorde-se ou não) determina que a pessoa que agiu em legítima defesa, isto é, que matou para se defender de uma agressão que estava acontecendo ou prestes a acontecer, não deve ser condenada, mas sim absolvida;
9. Isto está previsto no artigo no artigo 25 do Código Penal, que tem a seguinte redação: “Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem”.
10. Importante esclarecer que não é o Juiz, tampouco o Promotor de Justiça ou o Advogado que criam as Leis brasileiras. Inclusive, muitos discordam das leis existentes em nosso país, mas devem a ela obediência e aplicação;
11. Constatando, portanto, a ocorrência da legítima defesa, a ré foi absolvida com fundamento no artigo 25 do Código Penal combinado com o artigo 415, inciso IV, do Código de Processo Penal;
12. Importante, ainda, esclarecer que, diferentemente de alguns comentários que estão circulando nas redes sociais, a vítima não foi morta enquanto estava dormindo. Ao menos não há evidências neste sentido. Isto pois, ele não foi encontrado deitado no sofá da sala ou na cama, mas sim no chão da cozinha da casa, próximo à entrada do imóvel;
13. No momento dos fatos, somente estavam na residência a acusada e a vítima. Portanto, as informações de que a vítima foi atingida enquanto dormia ou qualquer outra informação sobre a dinâmica dos fatos ou foram inventadas por alguém, ou esta pessoa estava na residência no momento dos fatos e foi embora após a ocorrência do fato ou, por fim, essa pessoa obteve essas informações de algum modo, porém, não as apresentou à Polícia e deixou de colaborar com a Justiça na descoberta da verdade;
14. Da mesma forma, o exame de necropsia, que foi realizado pela Polícia Científica de Toledo, apontou a existência de somente uma lesão perfuro-incisa na região do peito, ou seja, uma facada, inexistindo qualquer evidência de que tenha havido qualquer outro golpe contra a vítima;
15. Portanto, a acusada, utilizando-se de uma “faca de serra”, deu UM ÚNICO golpe na vítima, infelizmente certeiro, que lhe atingiu em região vital do corpo e ocasionou o seu ferimento;
16. Após os fatos, a própria acusada acionou a Polícia Militar, realizando 5 ligações ao 190, e o socorro (192), tendo aguardado no local até a chegada dos policiais e do corpo de bombeiros. Portanto, a acusada não fugiu do local, tampouco negou que tivesse dado a facada na vítima;
17. De acordo com a versão da acusada, no dia dos fatos, ela teria sido ameaçada e agredida pela vítima. Inclusive, foi realizado um exame de corpo de delito na acusada, que comprovou a existência de lesões no seu pescoço, confirmando o seu relato de que a vítima teria a “pegado pelo pescoço”;
18. É importante esclarecer, ainda, que a decisão é tomada com base nas provas anexadas ao processo e não com base em conversas ou rumores. Se não consta no processo nenhum documento ou nenhuma testemunha (anônima ou não) informando que a ré, por exemplo, perseguia a vítima, que já havia lhe ameaçado outras vezes ou que era pessoa perigosa, não tem como o Juiz saber disso e levar isso em consideração. No direito costuma se utilizar a seguinte expressão: “o que não está nos autos (no processo) não está no mundo”;
19. Por isso, nem sempre o processo é capaz de revelar o que realmente aconteceu. Logo, é sempre muito importante que familiares e amigos, assim como vizinhos e demais pessoas que tenham qualquer conhecimento sobre um determinado crime, auxiliem as forças policiais e o Ministério Público na descoberta da verdade, podendo, inclusive, prestar informações de forma anônima (ex. Disque-denúncia n° 181);
20. Portanto, reforça-se que de nada adianta “todo mundo saber sobre a ocorrência de um determinado crime”, sobre seus detalhes ou quem é o “verdadeiro culpado” e ninguém ir até a Delegacia contar isso para o Delegado ou ao Fórum contar isso para o Promotor de Justiça, que, por sua vez, poderá requerer a convocação desta pessoa para ser ouvida em audiência perante o Juiz, pois, sem que essas informações cheguem até o processo, não podem ser usadas contra qualquer acusado. Por isso, às vezes, é possível que pessoas culpadas sejam consideradas inocentes pela Justiça, justamente por ausência de provas, o que se lamenta, mas não se pode evitar, afinal de contas, realizando mais de 40 audiências por semana e julgando mais de duzentos processos criminais por mês, não é possível que o Juiz seja um ser onisciente, que sabe de tudo, mesmo daquilo que não consta no processo;
21. Por fim, é importante esclarecer e informar que todos os familiares das vítimas, neste e em outros casos, podem ir até a Delegacia de Polícia, ao Ministério Público e ao Fórum (Vara Criminal) para obter informações sobre os processos de seu interesse;
22. Mais do que isso, os familiares podem contratar Advogado para representá-los durante o processo criminal ou, caso não tenham condições, podem pedir ao Juiz a nomeação de um Advogado dativo (pago pelo Estado), que auxiliará o Promotor de Justiça na indicação das provas e também poderá ajudar o Juiz a dar a decisão mais justa possível para o caso. Inclusive, a família poderá recorrer da decisão caso não concorde com o que foi decidido;
23. Encerrando, registra-se que o objetivo da presente NOTA não é o de convencer quem quer que seja sobre o acerto ou erro da decisão. O resultado é triste e lamentável, não importa por qual ângulo se analise. Uma pessoa foi morta e processo algum é capaz de reverter isso.
24. O objetivo, então, da presente NOTA é tão somente reestabelecer a verdade sobre o que consta no processo e informar a população sobre os seus direitos, inclusive clamando que auxiliem de forma ativa as forças policiais na descoberta e na investigação dos crimes cometidos na Comarca;
24. Saibam todos que a Justiça Criminal de Marechal Cândido Rondon é atuante, sobretudo nos crimes contra a vida, tendo condenado, somente no ano passado, mais de 20 acusados a penas que somam mais de 200 anos, estando todos eles devidamente encarcerados, em cumprimento de pena;
25. Por derradeiro, e não menos importante, expresso meus sentimentos aos familiares da vítima e os estímulo a recorrerem da decisão, pois, o Tribunal de Justiça poderá entender e decidir de forma diferente.
Com meus cumprimentos,
Gabinete do Juiz Substituto da Vara Criminal de Marechal Cândido Rondon.